As
minhas saudações a V. Exª.
Acabo
de ser espoliado do meu complemento de pensão de reforma (CPR).
De
tal unilateral, mas certamente muito democrática medida, fui informado, oficialmente,
através do ofício nº 2511,de 17 de Maio, da Direcção de Finanças.
Parto
do princípio de que tal complemento me foi atribuído em função dos préstimos da
minha actividade profissional desenvolvida ao serviço do Estado e da Nação, e
não por qualquer devaneio de gente insana, resquício revolucionário, tão pouco
por um capricho de favorecimento ilícito.
Não
tendo, outros sim, dado conta de me ter sido levantado qualquer processo judicial
que pudesse ter posto em causa a percepção de tal CPR, apenas posso concluir
haver alguém, um dia destes, ter acordado mal disposto decidindo, por sua alta
recriação, despojar-me de tal quantia, apesar de minguada.
A
explicação que recebi de V. Exª que, supostamente, me tutela e à instituição
que servi, durante 27 anos, pouco adianta – confesso – ao meu entendimento
sobre as razões de tal esbulho, embora deva reconhecer, o esforço que
dispensaram a esse intento, já para não referir o papel e tinta, gastos.
Seguramente,
por entendimento néscio da minha parte, apesar de – quero deixar claro – ter
concluído em tempo e com algum brilhantismo, a antiga 4ª classe, e já não ter
sido abrangido por nenhum curso saído de Bolonha, dizia, não consegui perceber
patavina do que me avançaram.
Apenas
intuí estar perante mais uma infame mescla de engenharia financeira, administrativa
e jurídica, a qual fazendo corresponder a um triclínico artigo ou a uma
estrambólica alínea ou despacho, uma certa quantia em euros, até que a totalidade
da reforma a receber no mês em causa e seguintes, equivalesse a essa descoberta
maior da civilização árabe, que dá pelo nome de “zero”.
Como
não consegui entender, apesar de ainda continuar a passar nas inspecções médicas
a que sou obrigado para continuar a poder desafiar as leis da gravidade – coisa
que a nobre instituição que reunia os dois vocábulos “Força” e “Aérea”, está em
vias de deixar de fazer – venho solicitar a V. Exª se digne informar-me das razões
objectivas pelas quais fui objecto deste exercício de disparo à carteira, modalidade
que nunca fez parte dos parâmetros avaliados na Carreira de Tiro de Alcochete…
E
como deixei de acreditar no Estado – que me mente e me rouba, sem que, pelos vistos,
isso cause a mais pequena perturbação psicossomática em toda a cadeia hierárquica – e que ainda conheci, minimamente, como
“pessoa de bem” ; me educaram que a existência de sindicatos era incompatível
com o exercício do “mister das armas”, e que os “Chefes” se preocupavam e
defendiam os seus homens (agora também tenho de dizer, mulheres!) vejo-me órfão
de pai e mãe, chefe de esquadra e juiz de comarca!
Talvez
o Sr. General, do alto do brilho prateado das estrelas me possa elucidar sobre
o que devo fazer.
Um
ponto (aquele em que me avisa? Ameaça? Discorre?) porém, existe no tal ofício,
com que me agraciou no seu esplendor comunicacional, que ainda se entende
menos: sobre o modo como me irá surripiar o que indevidamente me pagaram desde
o princípio do ano, dado que tal medida devia ter sido posta em prática, no
pretérito dia 1 de Janeiro.
A
competência dos serviços, de que V. Exª é o topo da pirâmide, desvela-me e só é
comparável à intrigante dúvida de como pensam ressarcir-se de tal pecúlio, já
que não tocam no meu vencimento dado o mesmo ter sido transferido para a CGA, entretanto
alcunhado de reforma.
Estou
certo de que descobrirão uma forma – sobretudo desde que, lamentavelmente,
deixaram entrar os esbirros das finanças, vasculhar nas contas das unidades –
mas, também, estou certo que tendo sido voluntário para ingressar na FA, não o
serei para colaborar nesse intento.
Posso
até garantir, que só não entrarei “ao passo”, se não puder.
Esmagado
pela evidência de tão lídimo amplexo de virtudes cívicas e militares, Subescrevo-me
Atento,
nada venerando e desobrigado.
João
J. Brandão Ferreira
TCorPilAv
(Ref.)
014391-L
(Das
mui antigas, nobres, por vezes gloriosas, mas quase extintas, Forças Armadas Portuguesas)
CARTA ABERTA AO CHEFE DO ESTADO MAIOR DA FORÇA AÉREA.pdf .pdf 124K Visualizar Transferência |